O PERÍODO HERÓICO
A fermentação das idéias modernistas em um grupo de jovens (Oswald e Mário de Andrade, Victor Brecheret, Di Cavalcanti, Menotti del Picchia…) que se une entre os anos de 1918 e 1921.
Mário de Andrade:
“O real movimento de modernização das artes brasileiras partiu do caso de se encontrarem um dia em São Paulo 7 ou 8 artistas paranoicos e mistificadores.”
Oswald de Andrade:
“Somos um perdido tropel em território irregular e hostil. Falo em nome de meia dúzia de artistas moços de São Paulo e daí o meu cálido orgulho incontido.”
Mário de Andrade:
“O Brasil não é para tais artistas assunto literário escolhido entre mil. É preocupação imperiosa. A realidade brasileira é trabalho consciente. Muito nos ajudará a obra dos historiadores, dos folcloristas, dos regionalistas, dos sociólogos. Não nos deve preocupar a opinião dessa gente séria possa ter de nós. Somos naturalmente para eles: loucos, pândegos e talvez mesmo cabotinos.”
Oswald de Andrade:
“São Paulo é já a cidade que pede romancistas e poetas, que impõe pasmosos problemas humanos e agita, no seu tumulto discreto, egoísta e inteligente, as profundas revoluções criadoras de imortalidade.”
Menotti del Picchia:
“São Paulo de hoje é um Paris, um Nova Iorque menos intenso, um Milão mais vasto. É uma formidável e gloriosa cidade ultramodema.”
Mário de Andrade:
“E, socialmente falando, o modernismo só podia mesmo ser importado por São Paulo. O Rio era muito mais internacional, com norma de vida exterior, porto de mar e capital do país. São Paulo era espiritualmente muito mais moderna porém. Fruto da economia do café e do industrialismo, São Paulo estava ao mesmo tempo em contato mais espiritual e mais técnico com a atualidade do mundo.”
Menotti del Picchia:
“Aos nossos olhos riscados pela velocidade dos bondes elétricos e dos aviões, choca a visão das múmias eternizadas pela arte dos embalsamadores. Cultivar o helenismo como força dinâmica de uma poética do século é colocar o corpo seco de um Ramsés a governar uma república democrática, onde há fraudes eleitorais e greves anarquistas.”
Oswald de Andrade:
“E com a mudança diária e formidável da própria graça fisionômica, a metrópole incontida, absorvente, diluviana de gente nova, de gente ávida, de gente viva, pensa outras ideias, escuta outros carrilhões, procura novos ritmos, perscruta e requer horizontes futuros.”
Mário de Andrade:
“É muito sabido já que um grupo de moços brasileiros pretendeu tirar o Brasil da pasmaceira artística em que vivia, colocando a consciência nacional no presente do universo. ”
Oswald de Andrade:
“A juventude extravasante nas escolas, nas calçadas, nos jardins citadinos está reclamando pelos cem poros ativos de sua sensibilidade, uma arte à altura da sua efusiva aspiração vital e de compasso com o senso profundo da sua responsabilidade americana. Essa arte existe.”
Mário de Andrade:
“Onde haja no território da pátria uma porção de raparigas lindas e de rapazes orgulhosos há latente, pulsando, um desejo de consagrar o sangue se preciso for para o engrandecimento e glorificação este Brasil bem-querido que merece e terá todo o nosso ardor e a nossa vida!”
Menotti del Picchia:
“Dar à prosa e ao verso o que ainda lhes falta entre nós: ossos, músculos, nervos. Queremos escrever com sangue – que é humanidade; com eletricidade – que é movimento, expressão dinâmica do século; com violência – que é energia bandeirante. Assim nascerá uma arte genuinamente brasileira, filha do céu e da terra, do Homem e do mistério.”
Mário de Andrade:
“Manifestado especialmente pela arte, mas manchando também com violência os costumes sociais e políticos, o movimento modernista foi o prenunciador, o preparador e por muitas partes o criador de um estado de espírito nacional.”
Sérgio Milliet:
“O poeta moderno vive de verdade. Às vezes, tem automóvel. Faz negócios quando pode. Há tanta poesia na Bolsa do café! Os trens, os autos, os vapores, as máquinas, são assuntos essencialmente poéticos.”
Oswald de Andrade:
“A questão paulista é uma questão futurista. Nunca nenhuma aglomeração humana esteve tão fatalizada a futurismos de atividade, de indústria, de história e de arte como a aglomeração paulista, povo de mil origens.”
Ronald Carvalho:
“O italiano, o alemão, o eslavo e o saxão trouxeram a máquina para a nossa economia. A vida tomou-se mais ativa, mais vertiginosa, mais cosmopolita, menos conservadora, enfim.”
Menotti del Picchia:
“Esse entrechocar de ambições, de gostos, de vontades, de raças oriundas dos quatro pontos cardeais, se refletem em todas as manifestações da vitalidade citadina, nos seus tipos de rua, na sua arquitetura, nas coisas expostas ao comércio, nas línguas que se falam pelas calçadas.”
Oswald de Andrade:
“Estamos no Trianon, devassando a cidade panorâmica no recorte desassombrado das suas ruas de fábricas e dos seus conjuntos de palácios americanos. É a cidade que, na ambição improvisada das suas feiras e na vitória dos seus mercados, ulula uma desconhecida harmonia de violências humanas, de ascensões e desastres, de lutas, ódios e amores.”
Menotti del Picchia:
“E a agitação da grande cidade, da grande feira, começou a ensanguentar as crônicas policiais. A fome do ouro, monstruosa tentou abalar a ética~ a luta agrícola, comercial, industrial, calafriou os nervos dos nossos artistas, latejando agora nos seus livros, como pegadas tangíveis da tragédia urbana atual.”
Mário de Andrade:
“Nós só seremos de deveras uma Raça o dia em que nos tradicionalizarmos integralmente e só seremos uma Nação quando enriquecermos a humanidade com um contingente original e nacional de cultura. O Modernismo brasileiro está ajudando a conquista desse dia. E muito, juro para você.”
Tristão de Atayde:
“Juca Mulato é a reconciliação do homem consigo mesmo, do brasileiro com sua terra, do bárbaro com seu isolamento, livro, que já encerra uma lição fecunda, uma comoção superior, é certamente o pregoeiro de outros surtos.”
Mário de Andrade:
“Ninguém pode se libertar duma vez só das teorias-avós que bebeu; e o autor deste livro seria hipócrita se pretendesse representar orientação moderna que ainda não compreende bem.”
Oswald de Andrade:
“Bendito esse futurismo paulista, que surge companheiro de jornada dos que aqui gastam os nervos e o coração na luta brutal, na luta americana, bandeirantemente!”
Mário de Andrade:
“Tenho horror inato às escolas e abomino aqueles que se imaginam condutores de artistas.”
Mário Brito:
“Oswald de Andrade era repórter, entusiasmado pelo discurso quis publicá-Io, e para conseguir as laudas originais de Mário, brigou a tapa. No dia seguinte, publicava o discurso de Mário de Morais Andrade, que se tomou, então, amigo.”
Ronald Carvalho:
“Se o sr. Mário de Andrade, através de todos os excessos desejados e passageiros de sua cruzada combativa, procura uma expressão poética nova da civilização brasileira do século XX. O sr. Osvald de Andrade penetra a realidade social de hoje.”
Mário de Andrade:
“Alto lá! Cada qual berre por sua vez; e quem tiver o argumento mais forte, guarde-o para o fim! Liberdade. Uso dela; não abuso. Tanto não abuso! não pretendo obrigar ninguém a seguir-me. Costumo andar sozinho.”
Oswald de Andrade:
“Mário de Andrade publicou então as suas primeiras poesias. Conhecedor da terra e da língua, dos ritmos regulares e dos novos efeitos, criou a poesia livre, desconhecida do Brasil. ”
Ronald Carvalho:
“Nada de supérfluo. A palavra tomada em seu valor exato e incisivo. A realidade, tema e episódios, possuída em bloco no espírito e procurando realizar-se sem artifício, com o máximo efeito na maior simplicidade.”
Oswald de Andrade:
“Uma estuante geração paulista quebra nas mãos a arapuca de taquara dos versos medidos.”
Mário de Andrade:
“Nossos sentidos são frágeis. A percepção das coisas exteriores é fraca, prejudicada por mil véus, provenientes das nossas taras físicas e morais: doenças, preconceitos, indisposições, antipatias, hereditariedade, circunstâncias de tempo, de lugar.”
Menotti del Picchia:
“Não só os vocábulos caem, chochos e secos, da árvore do vocabulário. Com as transmutações da ética e com as investigações do gênio industrial humano os sentimentos mudam, alguns surgem novos, outros desaparecem.”
Mário de Andrade:
“Em família o clima era torvo. Si Mãe eirmãos não se amolavam com as minhas loucuras, o resto da família me retalhava sem piedade. Eu tinha discussões brutais, em que os desaforos mútuos não raro chegavam àquele ponto de arrebentação. A briga era braba.”
Ronald Carvalho:
“Mário de Andrade é um homem do seu tempo e de sua raça, um homem tentado pelo demônio da realidade transcendente. Não são propriamente os elementos acessórios da atualidade – o automóvel, o aeroplano, a fábrica, as multidões desvairadas – que imprimem à sua poesia o caráter de modernidade que a distingue. Suas imagens são despojadas, geralmente, de qualquer artificialismo. São concretas, cruas e definidas. Ele reduz o espetáculo universal a esquemas audaciosos, e gira no tumulto de um realismo bárbaro magnífico.”
Mário de Andrade:
“Eu passara 1920 sem fazer poesia. Na minha leitura desarvorada, já conhecia até alguns futuristas de última hora. Concebi imediatamente fazer um livro de poesias modernas, em verso-livre, sobre a minha cidade. Não sei o que me deu. Fui até a escrivaninha, abri um caderno, escrevi o título em que jamais pensara Paulicéia Desvairada. O estouro chegara afinal, depois de quase ano de angústias interrogativas.”
Tristão de Athayde:
“Longe de ser mero futurismo de imitação, como se espalha, é Paulicéia Desvairada um livro que procura o que há de novo nesta civilização americana que tentamos, o significado literário de cem anos de independência.”
Menotti del Picchia:
“São Paulo de hoje, chegou a tal fastígio econômico que começa a dedicar seus ócios de enriquecido às produções de arte. Esse fenômeno – inédito ainda para a nossa vida de nacionalidade recente – é agradável de se constatar. Registra um duplo progresso: financeiro e cultural.”
Oswald de Andrade:
“Mas o ponto culminante da vitoriosa Guerra que os novos paulistas vêm fazendo contra os academismos produziu-se com Victor Brecheret que aí esteve jogado muitos meses num recanto do Palácio das Indústrias.”
Mário de Andrade:
“O movimento modernista tem, nos seus primórdios, dois fulcros. Um é Anita Malfatti. Outro é, agora, Victor Brecheret. Em tomo deles gira os vanguardistas de primeira hora.”
Menotti del Picchia:
“Certa vez, quando levam Monteiro Lobato para ver as suas esculturas, não suporta que o contista largue o chapéu sobre uma das estátuas. Retira-o com maus modos e joga-o acintosamente no chão.”
Victor Brecheret:
“Meus parentes não acreditavam mais em mim e, muito menos, em minhas esculturas. Fiquei um estrangeiro em minha própria terra, sem amigos, sem ninguém.”
Menotti del Picchia:
“Não se queixava o artista resignado: trabalhava, trabalhava. Esculpia, arrancava à greda carnosa figuras gigantes, gênios de olhos parados e músculos de aço, ídolos de ouro, misteriosos, esfingéticos Cristos pálidos, vitórias aladas.”
Mário de Andrade:
“Menotti deI Pie chia e Osvaldo de Andrade descobriram o escultor Vitor Brecheret, que modorrava em São Paulo numa espécie de exílio, um quarto que lhe tinham dado grátis, no Palácio das Indústrias, pra guardar os seus calungas.”
Menotti del Picchia:
“Só o grande Ramos de Azevedo o cobria com a sua proteção amiga e o seu entusiasmo de artista, o resto, ao ver-lhe as estátuas, essas torturas humanas, vazadas em barro, esses gritos de alma eternizados em pedra, escamecia-o.”
Mário de Andrade:
“Ora, Osvaldo de Andrade, passando pelas ruínas em construção do Palácio das Indústrias, soube que no segundo andar do prédio vivia um escultor. Subiu disposto a caçoar das academias. O hominho narigudo, com voz de baixo russo, abriu a porta. Brecheret. Osvaldo olhou o artista, já divertido. Brecheret olhou desdenhosamente o intruso. Inimigos. Uma hora depois: amigos íntimos.”
Oswald de Andrade:
“O porteiro nos disse que lá em cima anda um escultor trabalhando, um tipo esquisitão, de pouca prosa e que faz estátuas enormes e estranhas. Resolvemos subir para arreliar o excêntrico artista e o que vimos foi um deslumbramento para nós, pois estávamos diante de escultor original e poderoso.”
Mário de Andrade:
“Brecheret me concedeu uma Cabeça de Cristo. Afinal pude desembrulhar em casa a minha Cabeça de Cristo, sensualissimamente feliz. Isso a notícia correu e aparentada invadiu a casa para ver. E pra brigar. Berravam, berrava. Aquilo era até pecado mortal! Onde se viu Cristo de trancinha!”
Di Cavalcanti:
“O academismo idiota das críticas literárias e artísticas dos grandes jornais, isso desesperava nosso pequeno clã de criaturas abertas a novas especulações artísticas, curiosas de novas formas literárias, já impregnadas de novas doutrinas filosóficas.”
Mário de Andrade:
“Mas logo começou a luta por Brecheret, nosso estandarte. Oswaldo, Menotti e eu pelos jornais, críticos improvisados. Puxa! Fizemos uma barulheira danada. Divertimo-nos à farta.”
Klaxon:
“A luta começou de verdade em princípios de 1921 pelas colunas do Jornal do Comércio e do Correio Paulistano. Primeiro resultado: Semana de Arte Moderna.”
Mário de Andrade:
“Porque Victor Brecheret, para nós, era no mínimo gênio. Este o mínimo com que podíamos nos contentar, tais os entusiasmos a que ele nos sacudia.”
Monteiro Lobato:
“Admiremos sem reserva, que isso é arte de verdade, da boa, da grande, da que põe o espectador sério. Victor Brecheret – é este o nome do novo escultor, paulista de nascimento, extremamente novo ainda, 22 anos apenas, – Brecheret como escultor é produto do seu próprio esforço.”
A Gazeta:
“E os nossos críticos de arte, os lobos ferozes que, de dentuça arrefilada saíam outrora para despedaçar os transviados e os desequilibrados da arte, dormem agora o seu lento sono de inocência e de condescendência. Daqui a pouco, fazendo causa comum com aqueles que antes atacavam, pretenderão por certo que se arborize a cidade com matapaus e urupês para festejar dignamente o centenário.”
Menotti del Picchia:
“A liquidação literária, no Brasil, assume proporções de queima. O Brasil continuou colônia nas letras. É preciso reagir.”
Oswald de Andrade:
“Cuidado, senhores da camelote, a verdadeira cultura e a verdadeira arte vencem sempre. Um pugilo pequeno, mas forte, prepara-se para fazer valer o nosso Centenário.”
Mário de Andrade:
“São Paulo toda se agita com a aproximação do Centenário. Germinam monumentos numa floração de gestos heroicos e os jardins se congregam em formosos jogos florais de poesia e perfume. São Paulo se arreia de graças. São Paulo quer tomar-se bela e apreciada. ”
Menotti del Picchia:
“A nossa independência política não nos alforriou numa independência mental. O Brasil continuou colônia nas letras, que contestamos com patrióticos berros.”
Oswald de Andrade:
“Mas, senhores, é isso que vamos apresentar como expressão de cem anos de independência! Mas independência não é somente independência política, é acima de tudo independência mental e independência moral.”
Menotti del Picchia:
“Os paulistas, renovando as façanhas dos seus maiores, reeditam no século da gasolina, a epopéia das bandeiras.”
O Estado de S. Paulo:
“O trabalho do jovem e já consagrado escultor paulista, bela e audaciosa obra de arte, foge a todos os moldes até hoje seguidos para a concepção e realização dos monumentos comemorativos tomou do riquíssimo tema das bandeiras e sobre ele plasmou um potente trabalho escultural.”
Victor Brecheret:
“Essa figura enigmática que pompeia na frente do monumento, solene como uma deusa, é a Terra Brasileira. Foi ela quem os atraiu com o esplendor das suas promessas, monstro verde dos seios de ouro.”
Paulo Prado:
“Brecheret não imita nem copia os mestres do passado; é moderno na concepção e na execução. O escultor não pertence a nenhuma escola em ismo e da sua imaginação criadora brotam espontânea e ingenuamente as formas plásticas do seu sonho.”
Mário de Andrade:
“Brecheret, para melhor caracterizar o espírito dessas bandeiras e o sonho destes homens magníficos, usa do símbolo. Uma longa teoria de seres gigantescos, desnudos, avança lentamente para a conquista do ideal que os enleva. Os últimos deles, figuras dum movimento extraordinário, arrastam a barcaça que as corredeiras impediram de passar. Nada os detém.”
Victor Brecheret:
“O Movimento devia exprimir, na harmonia do seu conjunto, unificados em bloco, toda a audácia, o heroísmo, a abnegação, a força, expedidas em desvendar e integralizar o arcabouço geográfico da Pátria. É por isso que o monumento foi inicialmente concebido em bloco, exprimindo no seu conjunto, pela sóbria imponência de suas linhas e pela solidez dos seus grupos, as duas forças criadoras da Epopéia: Audácia consciente e Heroísmo abnegado.”
Menotti del Picchia:
“Brecheret é brasileiro, paulista, fruto de uma amálgama de raças caldeadas no nosso clima profundamente tocado pelas forças ambientes. Daí sua arte conservar algo visceralmente nosso, tropical, indígena, quer na expressão anatômica das suas figuras, quer no movimento bárbaro e interior que as anima.”
Di Cavalcanti:
“Brecheret realiza estes conceitos. Sua obra é a representação de um espírito maior. Está na altura dos grandes artistas, pela forma e pela ideia. O Brasil deve ter orgulho em possuir um artista como é o solitário escultor paulista. ”
Monteiro Lobato:
“Honesto, fisicamente sólido, moralmente emperrado na convicção de que o artista moderno não pode ser um mero ecletisador de formas revelhas e há de criar arrancando-se à tirania do autoritarismo clássico, Brecheret apresenta-se-nos com a mais séria manifestação de gênio escultural surgida entre nós.”
Di Cavalcanti:
“Victor Brecheret é na escultura brasileira uma força nova. Culto, criado num ambiente moderno, ele realiza sempre dentro dos mais puros ideais artísticos, obras cheias de verdade e personalidade. Na escultura brasileira Brecheret é o vulto maior.”
Menotti deI Picchia:
“Daqui há anos, quando o nome de Brecheret estiver, em Paris, os seus patrícios olharão agradecidos para o mármore soberbo, louvando aqueles que em boa hora dotaram São Paulo com uma da criações máximas da nossa capacidade artística.”
Mário de Andrade:
“Mas o Osvaldo sofreu golpe decisivo. Ficou doente. Doença deliciosa e gravíssima não registrada nos dicionários médicos. Mania de descobrir gênios. De repente todos nós viramos gênios. Di Cavalcanti era gênio. Menotti Del Picchia era gênio. Brecheret outro. Também Anita, Guilherme de Almeida e todos nós. Um limbo dantesco! Foram momentos de gostosa ebriedade. Que entusiasmo!”
Oswald de Andrade:
“Fui eu quem escreveu contra o ambiente oficial e definitivo, o primeiro artigo sobre Mário de Andrade e primeiro sobre Portinari.”
TODOS:
“na Cadillac mansa e glauca da ilusão
passa o Oswald de Andrade
mariscando gênios entre a multidão. “
Antonio Ferro:
“Oswald, na sua vibração contínua, na sua inteligência trepidante, na sua inteligência elétrica, no tumulto das suas palavras que atropelam como automóveis, é uma cidade, uma capital, um país. Oswald é o Brasil, o Brasil que se multiplica, o Brasil enorme, o Brasil que chega até Paris.”
Sérgio Milliet:
“Era um porão alto na praça da República. Alguns quadros de Di Cavalcanti, um busto de Brecheret e o gordo anfitrião Oswald de Andrade a descobrir gênios nos amigos. Os freqüentadores do porão eram tão diferentes de gostos e temperamentos que só mesmo a personalidade mais que complexa, surre alista, de Oswald os podia reunir num mesmo local.”
Sérgio Milliet:
“Você já ouviu falar de Villa-Lobos? Pois ele fez executar suas obras em Paris com sucesso. É um compositor vagamente ligado ao grupo dos Seis, mas o maior músico do Brasil assim mesmo.”
Ronald Carvalho:
“A música e Villa-Lobos é uma das mais perfeitas expressões da nossa cultura. Palpita nela a chama da nossa raça, do que há de mais belo e original na raça brasileira. Não é a índole portuguesa, africana ou indígena. O que ela nos mostra é uma entidade nova, o caráter especial de um povo que principia a se definir livremente.”
Sérgio Milliet:
“A música de Villa-Lobos é uma das mais perfeitas manifestações da alma brasileira. Feita de melancolia e de humor, ela traduz o que caracteriza esse povo jovem saído de um povo triste.”
Ronald Carvalho:
“Villa-Lobos sente a vida como uma criação contínua. Sua arte é masculina, imperiosa. Ele compreende a realidade como uma sucessão contínua de instantes, onde cada instante de degrada em movimentos infinitos. Ele não quer ser novo nem antigo, mas simplesmente Villa-Lobos.”
Mário de Andrade:
“A pré-consciência primeiro, e em seguida a convicção de uma arte nova, de um espírito novo viera se definindo no sentimento de um grupo de intelectuais paulistas. De primeiro foi um fenômeno estritamente sentimental, uma intuição divinatória, um estado de poesia. E ilhados na enchente de escândalo que tomara a cidade, nós, três ou quatro, delirávamos de êxtase.”
Folha da Noite:
“Não é só um problema de estética, mas deve ser estudado como fenômeno de patologia mental. O desejo incontido de chamar a atenção, o desequilíbrio de alguns cérebros e o verdor da mocidade são os principais motivos e o que caracteriza os adeptos desta escola. ”
Oswald de Andrade:
“Considera-se um povo pela sua cultura; é a expressão máxima da raça. Passam os politiqueiros, passam os tiranos, passam os milionários e os agitadores de praça pública, apaga-se a memória dos que foram grandes à força, e ficam os artistas.”
Mário de Andrade:
“Osvaldo crê nas ideias que prega e nos seus próprios gestos. Daí viver assim entregando a alma como distribuidor de anúncios. Uma das faculdades que mais admiro em Osvaldo é esse poder certeiro de interessar e divertir. A raridade do bom palhaço vem disso.”
Oswald de Andrade:
“Eu nunca fui capaz de contar sílabas. A métrica era coisa a que minha inteligência não se adaptava, uma insubordinação a que eu me recusava terminantemente.”
Mário de Andrade:
“Osvaldo acredita no que faz. Está certo de que descobriu a pólvora e agora a arte vai se remodelar, faz. Tem assim duas das maiores riquezas do artista: fé criadora e dom de divertir. Admiráveis qualidades de clown.”
Oswald de Andrade:
“Último Passeio de Um Tuberculoso Pela Cidade De Bonde, o poema, descritivo, de inspiração urbana, mais lírico do que romântico, quando mostrado aos amigos, era pretexto para zombarias. Ao lê-lo ou ouvi-lo perguntavam, invariavelmente, da métrica e da rima.”
Carlos Drummond:
“Como todos os de sua geração, talvez sem saber, Oswald de Andrade está se sacrificando para que amanhã os nossos meninos tenham uma poesia com a cor e o cheiro do Brasil.”
A Noite:
“O que há no Brasil, o que ele e os seus companheiros fazem, é o modernismo, puro modernismo, isto é, guerra ao passadismo.”
Carlos Drummond:
“A grande tolice do meu amigo Oswald de Andrade é imaginar que descobriu o Brasil. Absolutamente não descobriu tal. O que ele fez foi descobrir-se a si mesmo. Verificou que era brasileiro, achou graça na história e acabou levando a sério a idéia de pátria.”
Mário de Andrade:
“Isolados do mundo ambiente, caçoados, evitados, achincalhados, malditos, ninguém não pode imaginar o delírio ingênuo de grandeza e convencimento pessoal com que reagimos. Qualquer página de qualquer um de nós jogava os outros a comoções prodigiosas, mas aquilo era genial!”
TODOS:
“O intelectual brilhante Oswald de Andrade
Divulgou lisamente, em seu artigo,
O plano de arrasar tudo o que antigo
For em Arte e bancar novidade.
E, para tal provar à saciedade,
Citou soberbos versos. Mas que digo?
Se nem os entendi! Perdoe o amigo
E não me leve a mal esta verdade!
Penso, no entanto, que o bizarre Artista.
Embora seja um poeta futurista,
Não é, por certo, um poeta futuroso.”
Mário de Andrade:
“Houve de fato reação. Mas que de inexatidões! que de injustiças! que de perversidades! A luta pudera ser bela e nobre: não foi mais que um acervo de leviandades, mentiras, baldões. As leviandades estiveram mais conosco, mas não os baldões nem as mentiras.”
Crítica:
“O último escândalo literário, proveniente da publicação dumas poesias de tendência modernista por Oswald de Andrade, trouxe-me o nojo de ver a leviandade com que as penas correm sobre o papel.”
Oswald de Andrade:
“O erro dos nossos censores é o erro de todos os envelhecidos: estão fora da psicologia do telégrafo sem fios, do aeroplano, da estrada empedrada de automóveis. Respeitemoolos. Mas que eles também respeitem o surto divino da metrópole cosmopolita.”
Mário de Andrade:
“Foi uma ruptura, foi um abandono de princípios e técnicas conseqüentemente, foi uma revolta contra o que era a Inteligência nacional. ”
Oswald de Andrade:
“Um, Menotti, e outro, Ronald, combatem ao lado de Mário de Andrade, que é atacado pelos srs. parnasianos e maníacos da escolástica.”
Jornal do Comércio:
“Falta-lhe ardor, veemência, fulguração. Há trechos de prosa vil, enastoados em doses métricas, rematadas pelas rimas mais pobres.”
Menotti del Picchia:
“Fui fulminado com excomunhão maior. E eu sofri, porque era muito moço e tinha ainda vaidades. ”
Sousa Bandeira:
“Fala-nos o poeta dos seus sonhos, dos seus amores, do que supõe serem as suas desilusões, do que percebemos serem as suas crenças. E fala com arte, graça e entusiasmo. Que mais poderíamos desejar?”
Di Cavalcanti:
“A arte nos deve sempre trazer aos sentidos alguma coisa que faltava à nossa sensibilidade, ou que dentro dela adormecera. Se não traz, se é apenas reprodução do que estamos acostumados a ver sobre outra modalidade então não é arte.”
Menotti del Picchia:
“Com mais alguns anos e mais uns gestos desses, poderemos declamar São Paulo livre da endemia dos burros, mal que tantos estragos tem feito entre nós.”
Ronald Carvalho:
“É dos modernos rapsodos de S. Paulo que eu falo, agora. Eles são os bandeirantes de uma cruzada única, por enquanto no Brasil. Diante deles estava uma terra cansada, esgotada, empobrecida: a terra das letras nacionais. Eles trouxeram sementes novas e as lançaram, cantando, no chão fatigado. E o chão se abriu, de repente, em floradas impetuosas, e uma folhagem, picada de flores e de frutos virgens, se alastrou por toda a parte.”
Menotti del Picchia:
“É preciso reagir. É preciso esfacelarem-se os velhos e râncidos moldes literários, reformar-se a técnica, arejar-se o pensamento surrado no eterno uso das mesmas imagens. A vida não para e a arte é vida. Mostraremos, afinal, que no Brasil não somos um montão inerte e inútil de cadáveres.”
Mário de Andrade:
“Embora aqueles primeiros modernistas das cavernas, que nos reunimos em tomo da pintora Anitta Malfatti e do escultor Vitor Brecheret, tenhamos como que apenas servido de altiJalantes de uma força universal e nacional muito mais complexa que nós. Força vital que viria mesmo porque tudo isso que se faria, mesmo sem o movimento modernista, seria pura e simplesmente o movimento modernista.”
Menotti del Picchia:
“O aspecto de nossa vida mudou; a arte, que é o seu comentário, segue-lhe as pegadas, surgirá uma estética original e nossa, tocada de regionalismo amplo, fruto da fixação do tipo étnico nacional. Será essa a arte brasileira independente, sonhada pelos nacionalistas de visão larga.”
Correio Paulistano:
“Estamos numa fase de evolução, ou melhor, de gênese, em que todos os valoressartísticos, morais, sociais, raciais – existentes no país tendem a fundir-se para daí nascer um tipo. Tipo de tudo: raça, costumes, pensamento, estética. Estamos absorvendo.”
Menotti del Picchia:
“Tudo isso – e o automóvel, os fios elétricos, as usinas, os aeroplanos, a arte – tudo isso forma os nossos elementos da estética moderna, fragmentos de pedra com que construiremos, dia a dia, a Babel do nosso Sonho, no nosso desespero de exilados de um céu que fulge lá em cima, para o qual galgamos na ânsia devoradora de tocar com as mãos as estrelas.”
A Gazeta:
“Um grupo de distintos cavalheiros da nossa sociedade vai tentar a organização de um sarau futurista, que será sem dúvida, o maior escândalo artístico de que se tem notícia em São Paulo. Nós, que pensamos que a grande arte deve ser compreendida por todos, prometemos desde já a nossa crítica severa contra a iniciativa.”
Mário de Andrade:
“O período heroico, fora esse anterior, iniciado com a exposição de pintura de Anita Malfatti e terminado na festa da Semana de Arte Moderna.”
Menotti del Picchia:
“Essa vitória dá o que pensar. Pelo menos dá para pensar nisto:
1°) Que há muitos cérebros atrasados entre nós.
2°) Que esses cérebros representam a maioria.
3°) Que em matéria de arte estamos no período da pedra lascada.
4°) Que há um pequeno grupo, o tal caluniado grupo futurista, que parece enxergar mais que outros.”